A maldição de Arbon. Parte 9


XII.
Seguiram pela Floresta das Feras durante a fria madrugada e pararam quando Lissa comunicou que não estavam longe do mosteiro. Ela pediu-lhes que a acompanhassem até o templo dos Kamms antes de se dirigir até a casa. Eles passaram a avançar cautelosos e desviaram a rota para alcançarem o templo lateralmente e não se colocarem sob os olhos de possíveis vigias do mosteiro antes de estarem prontos para entrar. As construções eram próximas, mas estavam separadas pelo pomar, o que dava a cobertura das árvores e a distância de uma breve caminhada como salvaguarda.
O templo dos Kamms era uma construção de pedra acinzentada e que possuía uma grande porta de marfim entalhada com figuras que lembravam o ciclo da vida. Nos desenhos, havia uma pessoa oferecendo pães e peixes a um grupo de convivas; havia uma jarra de água sendo despejada por outra pessoa, e essa água enchia um rio que corria para o solo; havia, ainda, pessoas arando a terra e outras descansando à sombra de uma árvore, além de uma mulher oferecendo um bebê aos céus. Ao centro, havia o desenho de um caminho na união das duas bandas da porta o qual conduzia ao interior da construção. Ao alto do marco arredondado estava incrustado um cristal de jade moldado como um olho. Da mesma pedra, eram feitas as aldravas nas quais Lissa tocou para abrir as duas bandas da grande porta.
A meio-elfa hesitou à entrada. Olhou para as próprias mãos que tremiam. Os elfos esperaram, observando-a. Por fim, com um olhar sereno, Irkan tocou-lhe o ombro, encorajando-a. Ela pareceu ser despertada por aquele toque, então levantou os olhos para o altar que se erguia na extremidade oposta dentro do templo e, assim, caminhou lentamente até lá.
O local era sóbrio. Tratava-se de um pequeno salão retangular que tinha, ao longo das paredes, várias imagens moldadas em gesso e colocadas sob pedestais de pedra cobertos por forros de renda. A iluminação vinha unicamente da claridade que entrava pela grande porta; havia, entretanto, castiçais de bronze pregados em intervalos simétricos pelas paredes, cujas velas se encontravam apagadas. Não havia bancos ou cadeiras nem tampouco peças de tapeçaria. O altar era uma mesa de mármore esverdeado colocada junto à parede frontal e ladeada por gárgulas de pedra.
Lissa parou diante do altar e manteve-se ereta frente à parede lisa, fazendo sua prece silenciosa. Irkan e Macus pararam ao meio do templo e ali esperaram observando a criança e as imagens ao seu redor.
Por ali se encontravam Kamms de todos os tipos, alguns de olhares serenos, outros severos, outros indefinidos. Alguns de aparência humana, outros monstruosa. Alguns deles seguravam objetos como potes de água ou sementes, outros mostravam as mãos suplicantes. Um deles chamou particularmente a atenção de Macus. Este era uma imagem de aparência mais feminina, que possuía o ventre ligeiramente crescido e uma das mãos sobre a protuberância; um véu envolvia seu corpo e uma tiara com desenhos triangulares circundava sua cabeça. Ao lado da imagem, estava entalhado um pote com frutos, como maçãs, que ela abastecia com sua outra mão. Macus ficou encarando aquela imagem e se deu conta de que, de repente, Lissa se voltara e viera se juntar a ele. Ela tinha os olhos fechados e não parecia dar por sua presença. A menina caminhara às cegas e se colocara diante da imagem; lágrimas escorriam de seus olhos. O elfo olhou para o companheiro. Irkan tinha uma expressão ligeiramente surpresa e fez sinal para que o outro se afastasse.
Permaneceram ali por algum tempo sem que ninguém dissesse nada até que os elfos ouviram passos fora do templo. Preocupados se encararam e se voltaram para a menina. Lissa não parecia dar fé de nada que se passava ao redor. Então tomaram a frente, bloqueando o caminho entre ela e a porta, e esperaram.


Continua...

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