A maldição de Arbon. Parte 21

XXIV.

Depois de ajudarem a limpar tudo e a enterrar os corpos, os elfos assistiram à cerimônia de posse de Ari como novo sacerdote-chefe. Ele assumiu com a promessa de rever os costumes e de acabar com os sacrifícios humanos em homenagem aos Kamms. Nomeou Lissa como sua conselheira e prestou uma homenagem ao menino Kim. Nada foi dito sobre Nélius.

Ao raiar do terceiro dia, Macus e Irkan recolheram suas coisas e se aprontaram para partir. Despediram-se do novo sacerdote-chefe Ari e Lissa os acompanhou por uma parte do caminho pela Floresta das Feras relutando em dizer adeus.

— Vejo que é chegado o momento... — disse a meio-elfa quando os dois se detiveram e puseram-se a olhá-la. — Posso ter alguma esperança de vê-los novamente, nobres senhores?

— É pouco provável que isso aconteça, Lissa. — respondeu Irkan — Mas guarde a lembrança e nós faremos o mesmo.

— Volte, Lissa. — disse Macus simplesmente — E mantenha-se atenta. Desconfie sempre, todavia nunca perca a esperança.

Os olhos da menina se encheram de lágrimas, ela fez uma longa reverência e se afastou em silêncio. Depois que ela desapareceu na trilha, Irkan se voltou para Macus:

— Observei que você esteve sempre seguro de suas escolhas. E sei que tramou com o fantasma para conduzir o desfecho. Diga-me uma coisa: como pôde escolher entre quem deveria viver e morrer?

— Isso não era fácil? — exclamou Macus — A menina me pareceu possuir um coração sincero, uma alma pura. Tífan revelou sua essência. Ari me pareceu ser da mesma laia, porém um covarde. E acredito que o medo possa endireitá-lo, apesar de não crer que saberá conduzir uma ordem. Nélius era um homem mesquinho, vil.

— Quanto a isso não podemos afirmar com certeza, sabemos apenas que o chefe era um homem convicto, determinado. E você o sentenciou antes mesmo de conhecê-lo.

— Uma vida em troca de várias vidas... — respondeu Macus refletindo — Enquanto o sacerdote permanecesse, os sacrifícios das crianças consagradas também permaneceriam e o fantasma seguiria matando. Confesso que não concordei com essa história de sacrifícios desde o início e, apesar de, aparentemente, o ódio do fantasma transparecer um desejo de vingança, ainda assim me soou como um sentimento justo.

— Você julga rápido e precipitadamente. — disse Irkan analisando o outro — Mas não consigo dizer que esteja completamente errado... — o elfo parou antes de prosseguir e, respirando fundo, falou num tom categórico — A escolha entre a vida e a morte nunca pode ser fácil. Se assim lhe parece, há algo errado com você.

Macus refletiu um pouco e então deu de ombros.

— De tudo, lamento apenas termos perdido o garotinho. Isso me fugiu ao controle.

— É bom que se lembre disso. Nossa capacidade de controlar os acontecimentos é muito limitada.

— Sim, por isso nossos planos têm de ser os melhores possíveis. Não me esquecerei.

Os dois se fitaram por algum tempo. Macus pensava nos acontecimentos recentes e Irkan tomava uma decisão.

— Vou lhe revelar uma coisa e lhe propor uma escolha. — disse o elfo mais velho. — Desde que o convidei a acompanhar-me, devo admitir que tínhamos algo para você.

Macus apenas esperou, e Irkan prosseguiu:

— Caso aceite, vou levá-lo ao encontro de Mestre Inraim, o líder dos Cavaleiros da Magia.

Macus fitou o outro boquiaberto.

— Uau! Então você é um dos lendários Cavaleiros da Magia?! Mas por que o chamam de Caçador?

— Foi apenas uma alcunha que ganhei em um trabalho que realizei. E achei prudente mantê-la. Virá comigo?

— Certamente!

Assim os dois elfos tomaram o caminho do porto e pagaram passagens rumo a Lanória, ficando acertado que tomariam o primeiro barco mercante que partiria de Jurássis nos próximos dias. Embarcaram com um alvorecer claro e sem névoa e Macus ficou longamente na popa observando o continente se afastar e pensando em suas aventuras. Um futuro incerto o aguardava, mas seu coração estava cheio de esperança e ele ansiava por desbravar o desconhecido.

Fim. Por enquanto...