A maldição de Arbon. Parte 11
XIV.
Não era mais possível aos elfos esconderem a criança consagrada, então
eles moveram-se levemente, permitindo que os recém-chegados a vissem. Quando
todos se voltaram, o menininho estava sacudindo a meio-elfa para despertá-la.
Ela continuava chorando de olhos fechados sem se mover ou falar.
— Lissa! — gritou novamente o homem da mão ferida, sua voz soava repleta
de raiva.
A menina despertou assustada e o olhou. O garoto também estava
amedrontado.
— Sacerdote Tífan. — disse a meio-elfa se recompondo rapidamente. —
Agradeço aos Kamms por reencontrá-lo. Sacerdote Ari. — disse ela cumprimentando
o outro. — Kim. — ela sorriu para o pequeno companheiro e este relaxou
levemente.
— Então, Lissa... — disse Tífan — já refletiu sobre seus atos e voltou
para receber o seu castigo.
Macus apertou os olhos. Ia falar, mas Lissa começou primeiro:
— Quanto a isso, senhor, eu pedi o favor dos Kamms...
— O quê?! — o sacerdote exclamou surpreso.
— Minha amada Kamm da pureza e da vida me apresentou uma resposta.
— E essa resposta — cortou Tífan — obviamente é você se purificar por
meio do castigo físico, como determina a lei, e se oferecer humildemente em
sacrifício, para que os Kamms possam avaliar se vão acolhê-la ou não. Sacerdote
Ari, traga-nos o chicote. Você! Deite-se e tira a roupa! — ele completou
adiantando-se.
— Não é essa a resposta dos Kamms. — Macus interveio, colocando-se no
caminho e encarando o sacerdote com um olhar perigoso. — Certo, Lissa? — ele se
voltou para ela com doçura.
— O bom elfo tem razão, sacerdote Tífan. — respondeu a menina com as mãos
trêmulas e a respiração ofegante. — Ela me apresentou uma solução diferente
desta vez.
— Diferente?! — cuspiu ele avançando mais um passo — Como ousa? A lei é
única e, uma vez que você participa deste culto, tem de cumpri-la.
— Vamos ouvir o que a criança tem a dizer, sacerdote Tífan. — disse Ari
cauteloso. — Isso me parece necessário. — ele completou apontando discretamente
o olhar rumo aos elfos. Tífan conteve-se.
Lissa engoliu em seco e então falou:
— Eu não compreendi bem, mas a Kamm me disse que, se fosse possível ao
sacerdote Tífan me perdoar, nossa fé estaria salva, senão tudo estaria
arruinado.
Todos ficaram em silêncio.
Tífan estava com o rosto vermelho, mas se continha pensando. Ari também
refletia.
— Você ouviu essas palavras, exatamente desse modo, ou as está
interpretando dessa maneira? — perguntou Ari.
A criança ficou um pouco confusa.
— Ela falou em meu coração... — disse Lissa.
Tífan sorriu.
— Tente repetir o que ela falou. — pediu Ari olhando brevemente para o
companheiro e se voltando outra vez para a menina.
Lissa respirou profundamente, apertando as mãos. Olhou de soslaio para
Macus e, contendo o tremor que bambeava suas pernas, prosseguiu:
— Ela colocou em meu coração o desejo do perdão. Disse que...
— Fale o que ela disse. — cortou Ari.
— Ela falou... “O perdão é... uma dádiva... e deve ser oferecido a todos
que pedirem.” — Lissa respirava com dificuldade — Eu me questionei se merecia
dado que tive medo e fugi, mas ela falou: “não existe culpa em um coração
contrito”.
— Apenas isso? — pressionou Ari.
Lissa suava.
— Ela terminou dizendo que...
— Use as palavras dela. — cortou Ari outra vez.
— “Se o sacerdote não a perdoar, tudo estará arruinado.” Foi o que ela
disse. E então o sacerdote Tífan chamou meu nome e eu tive certeza de que ela
se referia a ele.
— Então você deduziu. — encerrou Ari.
— Sim. — disse ela soltando o ar e fitando o outro com a testa franzida.
— E isso é tudo que tem a dizer? — Ari tornou.
Ela olhou para os elfos. Irkan estendeu a mão apontando que ela
continuasse. Ela o olhava com o semblante meio confuso e meio desesperado.
— Então isso é tudo. — disse Ari outra vez, agora de um modo mais
definitivo. E, em seguida, olhou para Tífan e fez que ia sair.
— Perdão... — disse Irkan olhando dentro dos olhos da menina. Quando o
sacerdote se voltou, Irkan o encarou. — A criança consagrada ainda não
terminou. Vocês não deveriam ouvi-la até o fim?
— Ela não tem mais o que dizer. — interrompeu Tífan — Apenas está adiando
o próprio castigo.
Lissa então se adiantou em direção ao sacerdote que a encarava com um
misto de satisfação e fúria e prostrou-se a seus pés, tinha a cabeça baixa, as
mãos cerradas sobre as coxas e os olhos lacrimejantes.
— Peço que me perdoe, sacerdote Tífan. Eu me arrependo por ter fugido.
Assustei-me quando a confusão começou e todos se dispersaram. Tive medo de
morrer. Eu voltei para me oferecer depois que todos haviam ido, mas... Markamm
me impediu. Ele não queria... que eu morresse. Ele também enviou esses bons
elfos para me protegerem e me trazerem de volta em segurança.
— Provavelmente ele não queria um sacrifício impuro... — interrompeu
Tífan — Mas a aceitará quando você receber o seu castigo e se purificar.
— Se crê na vontade dos Kamms e respeita o seu desejo, ouça a menina. —
Macus interveio. — Eles não querem que isso continue.
— Não interrompa, elfo. — disse Ari ríspido.
— Eu suplico... — tornou Lissa como se os outros não tivessem falado —
Estou arrependida e suplico que não me castigue. Apenas deixe-me viver. — ela
chorava profusamente. — Imploro...
Continua...
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