A maldição de Arbon. Parte 2


Então é tempo de quarentena... Nesse momento em que atravessamos tantas dificuldades e apreensão, vamos aproveitar para refletir sobre nosso papel no mundo, sobre o quanto somos importantes e sobre o quanto podemos fazer para ajudar os outros. Vamos trabalhar dentro de nossas casas, conviver com nossas famílias, usar e abusar do telefone e das vídeo-chamadas... e, principalmente, vamos ter fé de que, se fizermos a nossa parte, sobreviveremos a essa fase e ressurgiremos outros, novos, mais fortes, experientes e solidários.
Se eu puder dar uma pequena contribuição, deixo aqui uma dica para distrair a cabeça, esquecer a doença e evitar a depressão. Além de conversar bastante com as pessoas queridas, arranjar um jeitinho de fazer um exercício físico em casa, é bom trabalhar a mente. Muitas coisas podem ser feitas, como uns trabalhinhos manuais para ajudar os necessitados (não custa lembrar o blog da Grazi que dá ótimas receitas de tricô e crochê que podem ser usadas para enfrentar a pandemia com solidariedade). E, claro, uma boa dose de literatura sempre faz muito bem! Então, caros arcairianos, vamos ler! E não se esqueçam: fiquem em casa! ;)

V.
Enquanto caminhavam pelas ruelas de terra do povoado e passavam pelas casas de adobe, os dois elfos conversavam sob a luminosidade viva de uma amarelada lua crescente que brilhava no céu respingado de estrelas como um sol incandescente.
— Irkan, quero saber se entendi bem essa questão das oferendas...
— Você ouviu sobre um fantasma e quer saber sobre as oferendas? — cortou o outro.
— Sim. — disse Macus simplesmente. — Além do mais, parece que as coisas estão relacionadas...
— É o que parece. — concordou o outro. — Você entendeu bem. As crianças aqui são oferecidas para aplacar a ira dos Kamms quando eles se mostram descontentes com alguma coisa.
— E de que tipo de coisa estamos falando?
— Creio que nem eles mesmos sabem ao certo que coisas são essas que causam ira, mas sabem como se dá sua manifestação. São os maremotos, as tempestades, as secas, os deslizamentos, os ataques de animais, os naufrágios, as pestes e outras coisas do tipo. Quando as pessoas daqui percebem os sinais de tais catástrofes, ou quando estas acontecem, eles oferecem uma criança ou um animal consagrado, dependendo do caso, em um ritual como o que Merbion mencionou. Por aqui, tanto homens quanto elfos respeitam essa crença e a praticam.
Macus tinha um olhar pensativo e fitava, incomodado, o companheiro.
— Espere um pouco. — Macus parou — Essas pessoas... as oferendas... estão presas no tal mosteiro que foi atacado?
— Elas não estão presas, Macus. — respondeu Irkan — Vivem lá por livre e espontânea vontade.
O elfo mais jovem fez um gesto de descrença.
— É preciso conhecer o mundo para entendê-lo, Macus. É por isso que estamos aqui. Continue andando.
Os dois voltaram a caminhar, porém logo Macus tornou.
— Você já fez alguma oferenda?
— Todos os dias eu ofereço e agradeço por minha vida ao Único... — disse Irkan devagar — Mas respeito todas as divindades. Cada uma delas cumpre seu papel neste plano.
— Você não respondeu o que perguntei... — disse Macus com sagacidade.
— Eu nunca realizei um ritual de sacrifício, humano ou animal, se é o que quer saber. Mas não comece por julgar as crenças dos outros. Procure, antes, entendê-las. Agora me diga. Em que acredita?
— Eu acredito... que tudo aquilo que você deseja, pode alcançar, desde que se dedique e trabalhe para tal.
— Isso não é uma crença... — Irkan refletiu — Ainda há pouco deu graças junto comigo pelo alimento. Por que fez isso? Aliás, tem-no feito desde que se juntou a mim. Por que o faz?
Macus aparentemente fora pego desprevenido e pôs-se a refletir.
— Eu acredito que, sendo privilegiado por ter o que comer, enquanto outros não o tem, devo ser agradecido pela... oportunidade? Pela terra que o produziu... pelas mãos que trabalharam... pelas chuvas, pelo sol... Sou grato à... natureza.
— Então você crê, como os arbonianos, nas divindades da natureza?
— Não! — ele parou novamente — Nunca havia pensado realmente sobre isso... — confessou envergonhado.
— Então comece a pensar. — Irkan foi categórico — O importante, inicialmente, é reconhecer que não existe apenas o seu modo de pensar ou de agir. Não podemos explicar tudo pela nossa lógica. Verá que, aonde quer que vá, se surpreenderá, mesmo que com uma mínima atitude ou costume. Mas verá também que as pessoas não são tão diferentes quanto imaginamos. Esteja sempre atento.
Eles prosseguiram caminhando em silêncio. Depois de um tempo, Macus tornou.
— Deveríamos ter perguntado onde fica esse mosteiro...
— Você ficou realmente interessado... Chegará o momento de irmos até lá. Por ora, vamos até a praia.

Continua...

Comentários

  1. Que bom que os contos estão de volta!
    Espero o continua...
    E a continuidade do livro também!
    E sim, ler e tricotar fazem muito bem à cabeça.
    Recomendo a todos!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigada pela leitura, Grazi!
      Sim!O contos voltaram!
      A continuação do livro está um pouco atrasada, mas, enquanto isso, a historinha de Arbon vai ganhando sequência...
      Seguimos lendo, escrevendo e tricotando! ;)
      Beijos

      Excluir
  2. Ei Élida . Boa iniciativa de entreter as pessoas neste momento de isolamento. Que bom que voltou....

    E adorei sua indicação do blog da Grazi...o doando artes !
    Com o friozinho chegando....uhmm..maravilha.

    Bj

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá! Que bom que gostou! Tricô para aquecer do frio e literatura para aquecer a mente!
      Continue acompanhando as histórias de Arcaires, você não vai se arrepender! ;)
      Bjos

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Pactos. Entre justos e pecadores. Parte 1

Saga das eras esquecidas completa!

A carta